Luís Valente de Oliveira (Professor de Engenharia, vice-presidente da Associação Empresarial de Portugal, ex-ministro PSD), escreve no Expresso (21 de Outubro de 2006) sobre o pode autárquico. Transcrição, com a devida vénia:
»Para um país muito centralizado, como era Portugal em 1974, houve um enorme progresso em matéria do poder local. É bom relembrar que, até então, os presidentes das câmaras municipais eram designados pelo ministro do Interior, sendo os titulares escolhidos entre as pessoas afectas ao regime. Até os planos de urbanização eram aprovados centralmente, o que conduzia à situação anómala de não haver praticamente documentos em vigor devidamente aprovados. As obras que se faziam eram decididas centralmente, desempenhando os autarcas funções de representação dos interesses municipais junto dos membros do Governo de quem pretendiam apoio material e patrocínio das suas ideias.
Depois de 1974, o poder local foi sendo construído a pouco e pouco mas de forma muito consistente. Foram generalizadas as práticas democráticas para designação dos órgãos locais correntes na Europa ocidental, tendo o processo de aprendizagem sido rápido. Hoje, os hábitos respectivos estão consolidados. Por outro lado, os resultados práticos são visíveis: as pessoas vivem melhor, os equipamentos multiplicaram-se e o país ficou, seguramente, mais coeso em termos territoriais. Muito se tem, ainda, de andar, porque surgiram desafios novos de natureza económica e social. As autarquias têm de participar mais na consolidação da base económica dos municípios e de assumir um papel mais determinante na preparação dos jovens portugueses, na sua educação e formação.
Todas as autarquias acabaram por conseguir preparar Planos Directores Municipais. É preciso agora partir para a elaboração da segunda geração desses planos, muito mais ligados à prosperidade económica dos concelhos, mais realistas e, também, mais participados.
E o próprio funcionamento dos órgãos de Governo autárquico tem de ser progressivamente melhorado, bem como o do aparelho administrativo em que aqueles se apoiam.
A construção institucional não é uma tarefa que se possa considerar concluída. Está sempre em evolução e em processo de melhoria progressiva.
O país deve muito aos milhares de autarcas que o serviram. Mas tem de forçar a evolução no sentido do robustecimento do papel das instâncias locais. Ora, para que isso aconteça, a ligação entre o que se faz e os meios mobilizados para o fazer tem de ser progressivamente mais directa. Isto quer dizer que o peso dos recursos financeiros municipais tem de ser cada vez mais ligado aos impostos locais decididos e explicados pelas autoridades locais e avaliados pelos destinatários locais. O papel do chamado Fundo de Equilíbrio Financeiro, que é um mecanismo de perequação, tem de se limitar a sê-lo de facto, dando atenção prioritária às autarquias locais que efectivamente sejam tão desprovidas que não se revelem capazes de gerar as receitas que os seus eleitos locais hão-de administrar sob o julgamento próximo dos destinatários, quer dizer dos munícipes.
Não se pode deixar de reconhecer o trabalho excelente da imensa maioria dos autarcas ao longo dos últimos trinta anos. Mas tem de se manter um espírito exigente em relação à evolução do papel das instituições que tem de se processar num quadro de estabilidade mas não de imobilismo. A evolução das práticas tem de ser constante, sendo no campo da cobrança de receitas e na ligação com a sua realização que se deve, hoje, insistir mais.
Não se pode evoluir nem com instituições mal desenhadas nem com procedimentos estáticos. As nossas instituições locais estão razoavelmente desenhadas. Temos de acomodar no quadro existente uma evolução que ajude a melhorar, em permanência, o funcionamento democrático, a responsabilização dos eleitos e a participação dos eleitores.
segunda-feira, outubro 23, 2006
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