Sob a rubrica “A Olhar p’ró Pico” e com o título «No vulto» de uma semana inteira o VULTO MAIOR esteve na Matriz”, João Brum publicou na edição de hoje (8 de Setembro) do jornal Ilha Maior, o artigo, ainda sobre a Semana dos Baleeiros. Sobre o mesmo tema, outro artigo, desta vez de Carlos Alberto Machado, também sobre a Sinfónica e o Coral das Lajes, n’O Dever de 31 de Agosto (página 2), com o título “Beleza rara”. Com a devida vénia aos respectivos autores e jornais, transcrevemos na íntegra estes dois artigos. Aproveitamos para dizer a alguns dos nossos leitores mais assustados que a publicação de artigos de imprensa aqui não nos obriga a estarmos de acordo cem por cento com eles; publicamo-los por nos parecerem perspectivas bem fundadas sobre a nossa vida social e por isso a solicitarem a serena reflexão de todos. Feito o esclarecimento, eis as prosas:
No «vulto» de uma semana inteira o VULTO MAIOR esteve na Matriz
À parte o religioso, cada vez menos “popular”, o grande vulto da Semana dos Baleeiros teve afinal lugar no seio da Igreja Matriz das Lajes.
Refiro-me à exibição da Orquestra Sinfónica Juvenil, só e em conjunto com o Grupo Coral das Lajes do Pico. Segundo a análise que brota de currículo uns graus acima do já por alguém dito “popularucho”, este acontecimento distinto fez a cúpula de toda a Semana e de suas celebrações.
Nem todos, é certo, pensarão do mesmo modo, por faltar-lhes tasca ao lado e o estrebuchar dos sons, mas trata-se da harmonia do talento, e para ela e por ela a Igreja encheu-se como nunca a vira nos três anos em que aqui resido. Os aplausos falaram por si: o que toca na alma sai pelas mãos, lê-se nos olhos, comunica-se e irrompe em êxtase.
Digam que esta análise é impressionista. Não faz mal. Para um amante da música clássica e de corais, mesmo que a escola lhe falte nestes ramos, não lhe falta, porém, a sensibilidade e o uso do bom gosto. É que o clássico é inigualável e de criatividade que eleva e recria. Dêem-me Tchaikosvsky, Beethoven, Mozart, Lizst, Bizet, mesmo Gershwin, e metam-me uma pena na mão, que logo me sinto a perder de vista dos “zabumbas” importados da América, esses que instigam ao roçar e ao despir, ao álcool e à droga que devastam a juventude.
O CONCERTO na Matriz das Lajes valeu, superou as demais actividades culturais que os organizadores da Semana dos Baleeiros trouxeram. O resto, mormente o que enche o bucho e ensurdece, ou o que endoidece e provoca, ofende e rasga a bílis, e ainda arranca lamentos a quem foge a solavancos na velhice ou na doença, é, digamos, negócio. Daqui se exclui o contributo louvável das filarmónicas e o apludível Muitieramá.
O CONCERTO, ao contrário da “festança”, foi de encher as medidas. Na Matriz, talhada para o som do instrumental e das vozes, atingiu o auge e o júbilo. Não há harmonia sónica, ou vozes em uníssono, que se comparem às de uma orquestra sinfónica ou de um grupo coral, ambos estes de renome além fronteiras.
Nas Lajes do Pico temos o Maestro Emílio Porto, que é de formação inicial e essencialmente clássica, portanto ninguém melhor do que ele, na nossa lavra, poderia ir capazmente ao âmago deste espectáculo musical, e espera-se que o faça sem delongas. Apenas o analiso, melhor diria, exteriorizo, como espectador e apreciador.
À parte, repito, o lado religioso em honra da Padroeira dos Baleeiros, a minha ida à Igreja Matriz das Lajes valeu pelos sete dias dos festejos. Apelaria, portanto, às entidades organizadoras para que, de futuro, reconheçam que mais vale pouco, desde que seja bom, neste caso óptimo.
João Brum
Beleza rara
A beleza de um acontecimento está muitas vezes no inesperado de um encontro: num poema, por exemplo, quando uma palavra vem juntar-se a outra de forma singular e assim desperta em nós uma experiência de beleza; o mesmo para uma forma diferente de juntar palavras familiares de uma maneira nunca antes vista; ou a beleza que um crente sente quando é tocado por algo que o transcende.
Por estas ou por outras razões igualmente difíceis de explicar, na noite de ontem, Sábado de Lourdes, na Igreja Matriz das Lajes do Pico, fomos todos surpreendidos por momentos de rara beleza. E, creio profundamente, que a beleza experimentada foi ao ponto de nos deixar a todos com uma lágrima a bailar nos olhos e a sentir um aperto na garganta. Foi assim que me senti e foi isso que me pareceu ver nos rostos de muitos homens e mulheres de todas as idades e origens.
Os lajenses presentes sabem do que falo: do encontro, de rara beleza, entre o Grupo Coral das Lajes do Pico e a Orquestra Sinfónica Juvenil, de Lisboa. Olhei demoradamente para cada rosto do coro e em certos momentos tive receio que não conseguissem cantar mais, tal era a emoção, a alegria e o deslumbramento com que o faziam. Quando um momento destes tem lugar tão perto de nós, tudo se dissipa e fica apenas o sentimento de comunhão de um acto sagrado que é este, o de saber unir espiritualmente pela música centenas de pessoas.
Nas filas atrás de mim ouvi expressões como “espectáculo inesquecível!”, “tão lindo!” , “momento histórico!”: todas tão verdadeiras e ao mesmo tão incapazes de dizerem tudo o que quereríamos dizer sobre o que tínhamos acabado de presenciar.
Num outro plano, julgo que este acontecimento vem demonstrar quão estéril é a discussão sobre a primazia, em termos de genuinidade e qualidade, do “tradicional e popular” ou do “clássico e erudito”. O encontro entre o Grupo Coral das Lajes do Pico e a Orquestra Sinfónica Juvenil, de Lisboa demonstra claramente que as duas distintas formações têm imensos pontos de contacto; demonstra claramente que todos ganhamos quando partimos de coração aberto e boa fé para um encontro de irmãos: a fraternidade da música e dos músicos. Não para esbater as diferenças entre uns e outros, mas para realçar o que essas diferenças juntas podem construir de belo. E, como vimos e ouvimos, foi uma construção de rara beleza!
Este caso concreto tem responsáveis: há meia dúzia de meses, na mesma Matriz, encontraram-se Manuel Emílio Porto, Maestro do Grupo Coral das Lajes do Pico, Sara Santos, presidente da Câmara das Lajes do Pico, e Vítor Mota, director da Orquestra Sinfónica Juvenil, de Lisboa. Não se conheciam entre si mas acreditaram na possibilidade de levar para a frente o projecto do encontro entre o Grupo Coral e a Sinfónica Juvenil. Mais tarde, com o mesmo coração aberto e boa fé, outros elementos foram sendo envolvidos no projecto. A todos eles devemos estar profundamente gratos.
Carlos Alberto Machado
sexta-feira, setembro 08, 2006
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